terça-feira, 30 de abril de 2013

Os males do pensar


“Ela me disse que era louca e eu não acreditei. Agora estou aqui, assistindo ao telejornal enquanto o rosto dela estampa todas as polegadas da minha televisão. E que rosto... Que boca...Aqueles olhos, agora encontrados fechados... Por que você? Por que eu? Por que nós?”
Não era nada mais do que um domingo comum. O levantar solitário acompanhado do silêncio da rua, as rosquinhas de morango de sempre e o deitar na cadeira de leitura. Passou horas lendo. Horas e mais horas. Até perder a concentração com o barulho do estômago. Revirou o armário em busca de algo rápido e fácil de se cozinhar, mas só encontrou embalagens do que não à apetecia.
Foi até a geladeira. Ah, a geladeira... Sempre tão fria. Lembranças frias. Encontrou o bilhete ali pendurado por um imã. O mesmo bilhete que enfeitava o local durante poucas e longas semanas. Leu-o novamente e quanto mais lia, mais queria ler. Sentia a necessidade de encontrar algo que tivesse entendido errado, desejava ter lido errado. Mas não. Não leu errado. Eram as mesmas palavras. Frias. Sempre frias como a geladeira.
Perdeu a noção do tempo e se viu subindo as escadas para a cobertura do edifício. Sentia o pé quente, que antes se encontrava dentro de uma meia, agora tocando o chão frio e empoeirado. Abriu a porta que dava de frente para um edifício ainda maior que o de sua moradia e saiu rodopiando com os braços abertos, podia sentir o vento soprar e seu vestido subir enquanto seus cabelos voavam. Isso era o número 12 da “Lista de Melhores Sensações do Mundo”. Sentou-se em uma das pontas do alto prédio e, enquanto aproveitava a última respiração ofegante, pôs-se a refletir.
Começou a pensar em todas as palavras que tal bilhete lhe trazia e o que cada uma significava. Era difícil encontrar onde errou com tantas imagens vindo em pensamentos. Sentiu-se enlouquecida, a mente barulhenta demais para aguentar a pressão que as lembranças faziam sobre ela. Levantou. Observou a rua. Pulou.
Pensar dói, machuca, corrói, mas pensar faz bem. Clarice costumava dizer: escrever é uma maldição. Ouso completar com: se escrever é uma maldição, pensar é uma maldição e meia. Contraditório. Pense nisso.